Fundado por humildes trabalhadores em 9 de maio de 1933, no Setor de
Locomoção da saudosa Rede de Viação Cearense (RVC), o Ferroviário
Atlético Clube é a maior expressão esportiva de raízes operárias do
Brasil, símbolo da democratização do futebol nacional e precursor do
futebol profissional no estado do Ceará.
O Ferrão, como é conhecido, cresceu rapidamente e logo tornou-se
uma das três grandes potências do futebol cearense. Sua história repleta
de glórias, que ganha, a cada ano, novos e belíssimos capítulos, faz
com que seu nome esteja sempre presente em qualquer abordagem sobre os
grandes clubes brasileiros.
De acordo com Ernani Buchman, ex-presidente do Paraná Clube e
autor do livro “Quando o Futebol Andava de Trem”, o Ferroviário não só é
um dos maiores vencedores entre mais de uma centena de times de origem
ferroviária no país, como é o que demonstra hoje a maior vitalidade,
seguindo forte diante de tantas dificuldades que assolam o futebol
brasileiro.
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A seguir uma crônica do próprio Valdemar Caracas, escrita em maio
de 1994, onde ele conta detalhes sobre a fundação do clube coral.
FUNDAÇÃO DO FERROVIÁRIO ATLÉTICO CLUBE
Por Valdemar Cabral Caracas
Vou falar sobre o Ferroviário, precisamente do Ferroviário
Atlético Clube. Nascido em 1933, fruto da junção das equipes "Matapasto"
e "Jurubeba", recebeu, na pia batismal, o nome de Ferroviário Footbal
Clube, mas, na confirmação da crisma, fiz substituir o Football por
Atlético.
Antes que me perguntem, vou dar, para vocês, esta explicação
primordial. Iniciava-se o ano de 1933, quando a direção da Rede de
Viação Cearense (RVC) autorizou a execução de serviços extraordinários
nas oficinas do Urubu, para a reparação de locomotivas, carros e vagões,
durante um expediente noturno, que começava às 18 e terminava às 20
horas.
Como o expediente normal expirava às 16:25, os operários mais
jovens que residiam longe dali (Barro Vermelho, Soure, Otávio Bonfim,
Quilômetro 8, Parangaba, Mondubim) resolveram aproveitar a hora de folga
para a prática de futebol; na preparação do campo, a relva retirada do
espaço a ele destinado, era constituída de mata-pasta e jurubeba.
A verve operária, que era fértil, escolheu, então, estas plantas
medicinais para denominação das duas onzenas que se defrontavam todas
as tardes, no campo improvisado. As traves das metas eram roliças,
confeccionadas que foram com tubos inservíveis, retirados de caldeiras
das "Marias-fumaça".
Com aquele "timezinho" cognominado apenas de Ferroviário, eles,
os operários-atletas, ou melhor, pebolistas, foram aos subúrbios onde
realizaram partidas amistosas, com real proveito para a harmonia do
conjunto, tudo sem qualquer interferência da minha parte.
Foi, então, que deliberei fazer dele gente, como se diz na gíria.
Reuní operários, meus companheiros, promovi sessão com livro para a
lavratura de atas, fiz um retrospecto da agremiação que surgia,
completei o nome desta e disse-lhes da importância daquela reunião, como
fator auspicioso para projeção da classe ferroviária.
Era pretensão minha que tal ocorresse a 9 de novembro, quando eu
completaria 26 anos, mas o entusiasmo exigiu a antecipação e não perdi
tempo, marcando o dia para 9 de maio, exatamente 6 meses antes de 9 de
novembro. Parti, então para a nova missão, aproveitando as horas
disponíveis da minha atividade funcional.
Fui tudo no Ferroviário, menos presidente, porque nunca quis
sê-lo. Fui pai, mãe, babá e, sobretudo, seu educador, disciplinando-o,
pois a equipe suburbana era useira e vezeira em tomar o apito do
árbitro, quando a decisão deste não lhe fosse agradável. Acabei com essa
prática danosa ao seu comportamento, o time se fez clube, cresceu e
está aí, vencendo os tropeços e dando alegrias a todos nós, seus
torcedores.